quarta-feira, 29 de março de 2006

Quaresma - Mensagem do Padre João Paulo Vaz

As coisas pequeninas

Quando, antes do início da Quaresma, me detive a pensar no que queria para este tempo de preparação que me é concedido, dei comigo a pensar que o caminho quaresmal me deve levar a ser uma pessoa melhor e que, para isso, eu não preciso de fazer grandes coisas: apenas preciso de mudar e transformar a coisa mais pequenina que encontro de errado em mim. Parece um contra-senso, não é?... Talvez não!
A Quaresma surge, no ritmo da vida da Igreja, como um tempo que somos convidados a uma maior e mais afectiva identificação com Cristo: o Cristo aclamado como rei (o rei do amor e do serviço), o Cristo sofredor, o Cristo da Paixão, o Cristo crucificado e o Cristo ressuscitado que "morte" nenhuma pode vencer. Preparar a Páscoa há-de implicar todo este caminho, de forma que eu leve já em mim, neste tempo e netesta terra, as marcas e as manifestações dessa vida que não acaba nem se esgota.
Para isto só há um caminho: o da santidade, escolhida e realziada em cada dia. É o caminho do meu aperfeiçoamento pessoal, numa escolha clara e inequívoca do bem, numa busca incansável de tudo o que Deus colocou em mim, num reconhecimento absoluto que eu sou o que tenho de bom, numa coerência inabalável com o que conheço de mim e numa esperança permanente de que Deus me quer como Ele. Por isso a ressureição...
E reparemos que Jesus Cristo procurou e viveu tudo isto!...
Assim, se eu pensar que crescer é adquirir e receber, à minha medida, tudo isto, em claros dinamismos de amor onde entram os outros e Deus, então entendo que ser melhor não se trata de fazer e mudar grandes coisas num momento, mas estar atento e transformar as pequeninas pelo reconhecimento, validação e actualização do que tenho de bom.
Além disto, desta forma eu sei que sou capaz. Quem é que não consegue mudar de lugar um punhado de terra?... Mudar uma montanha já não é tão fácil. E o que é uma montanha senão um grande número de punhados de terra?... Pois é! Se eu quiser mudar a montanha de uma vez (ainda mais, sabendo que a minha fé ainda não tem o tamanho da semente de mostarda!...), o mais certo é não ser capaz e desistir dessa tarefa. Vem com isto a desilusão, a frustração e a falta de confiança em mim. Se eu quiser mudar a montanha punhado a punhado, vou demorar, mas sei que lá vou chegar.
A Quaresma há-de ser isto também. E não esqueçamos que o positivo dinamiza-nos mais que o negativo, a bondade mais que o orgulho, o sorriso mais do que a angústia, a vida mais do que a morte, o amor mais que tudo.

Pe. João Paulo Vaz
(in Bota os Olhos Nisto, nº 36, Março de 2006)

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